APELAÇÃO CRIME. HOMICÍDIO CULPOSO. COOPERAÇÃO NA AUTOCOLOCAÇÃO DOLOSA EM PERIGO. ATIPICIDADE. CONDUTA NÃO ABRANGIDA PELO ÂMBITO DE PROTEÇÃO DA NORMA.
1. O réu foi denunciado por homicídio culposo, pois teria entregue a direção de veículo automotor à vítima, ciente de que ela, pelo seu estado de embriaguez, pelo uso de drogas e pela ausência de habilitação, não tinha condições seguras de conduzi-lo. Na direção do veículo, a vítima perdeu o controle e saiu da pista, vindo a falecer ao capotar e colidir.
2. A conduta descrita na exordial, de que réu e vítima ingeriram bebida alcoólica e consensuaram a direção pela vítima, não permite a imputação, ao apelado, do crime previsto no artigo 121, §3º, do Código Penal. Trata-se, no contexto dos autos, de resultado fora do âmbito de proteção da norma, que não abrange a autocolocação em risco e tampouco a cooperação nessa autocolocação dolosa em perigo.
3. O primeiro processo fático-causal desencadeado de comum acordo entre réu e vítima, designada a direção do veículo para aquele que se afirmava em melhores condições, não pode significar, sequer linguisticamente, um processo determinado como ação de matar culposamente alguém, nomeadamente se justo esse alguém é que perdeu o controle do veículo e, neste segundo processo fático-causal, deu azo à própria morte. A autocolocação de ambos em perigo não pode implicar responsabilidade penal subjetiva do mais cauteloso (na comparação) pela morte do mais ousado, que decorre de sua específica aceitação imprudente [de conduzir o veículo] e, num desdobramento fático posterior e não necessário, do fato de que “perdeu o controle do veículo e saiu da pista, capotando e colidindo”.
4. Também não é caso de emendatio libelli, pois o art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro é aplicável a quem conduz o veículo automotor com a capacidade psicomotora alterada, espelhada a conduta de quem entrega a direção a pessoa nesta condição no artigo 310 do mesmo diploma legal. Não há, para configuração deste tipo, prova suficiente de que o acusado tivesse ciência do estado e da inabilitação do ofendido. RECURSO DESPROVIDO.
(TJRS. Apelação Crime, n. 70073316788, 1ª Câmara Criminal, Rel. Des. Jayme Weingartner Neto, j. 25/04/2018).